segunda-feira, 2 de julho de 2007

Bloco conservador

Vivemos no Brasil, nos últimos anos, uma expansão significativa do ensino superior. Tal fenômeno, não suficientemente compreendido em suas características, natureza e conseqüências pelas lideranças acadêmicas nacionais, constituirá tema recorrente na agenda brasileira, na medida em que nenhum país do mundo alçou padrões mínimos de desenvolvimento econômico e social sem a formação maciça de sua juventude. Para tanto, penso ser importante a leitura do texto abaixo do Prof. Giuseppe Cocco, da Universidade Federal do Rio de Janeiro.


Bloco Conservador
"Os números do ensino superior são, para a jovem democracia brasileira, vergonhosos. O Brasil tem quase 10% da juventude entre 18 e 24 anos na faculdade (sendo 3% nas estatais, 7% nas particulares). Na Europa, a taxa de inclusão universitária é de 60% a 80%. Sem ir tão longe, na vizinha Argentina, 40% dos jovens freqüentam as universidades. Aqui, menos de 10%. E, destes 10%, dois quintos nem chegam a se formar. Diante disso, as tentativas do governo Lula de implementar o urgente processo de democratização do ensino superior enfrentam os interesses de dois blocos ideológicos. O primeiro mobiliza uma retórica de "esquerda": "Vamos barrar as reformas neoliberais de Lula e o FMI." Quando o governo regulamenta o estatuto filantrópico das universidades particulares atrelando-o a bolsas de entrada para alunos pobres (o Prouni), grita-se contra a privatização. Quando a reforma universitária previa a expansão do número de vagas, protestava-se dizendo que era preciso aumentar as verbas e os investimentos de permanência. Agora, que o governo lança um programa de aceleração da expansão das vagas de alunos nas universidades federais que prevê recursos suplementares para aquelas instituições que o realizam efetivamente (o Reuni), afirma-se que o decreto fere a autonomia universitária e a isonomia orçamentária. O segundo (e bem mais importante) bloco, o "liberal", mobiliza uma retórica "meritocrática" e, invocando supostos critérios de eficiência, opõe-se à democracia. Para essa tipologia de "liberais", o mérito é um ponto de partida (que necessariamente reproduz o violento status quo) e não aquele resultado que somente a excelência democrática permite alcançar. Direita e "esquerda" neo-arcaicas e corporativas se juntam em um único bloco conservador. O velho medo aristocrático transforma a democracia em monstro. Não é por acaso que os supostos liberais e a suposta "esquerda" condenam as cotas anti-racistas: é contra os movimentos dos que estão de fora das universidades por causa de sua renda e portanto de sua cor e, vice-versa, por causa de sua cor e, pois, por causa de sua renda que as elites neo-escravocrata e corporativo-tecnocrática se reproduzem".

Prof. Giuseppe Cocco
Escola de Serviço Social
Universidade Federal do Rio de Janeiro

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